Fórum Futurália 2020 – Indústria 4.0 – Aprender, Trabalhar e Competir Workshop 1 – Aprender – Sistemas de educação e formação Dia 30 de março de 2017
Fórum Futurália 2020 – Indústria 4.0 – Aprender, Trabalhar e Competir
Workshop 1 – Aprender
– Sistemas de educação e formação
Dia 30 de março de 2017
Coordenador:
Etelberto Lopes da Costa
Relator: Dora Santos
Participantes:
- Ana Cláudia Valente – Agência Nacional para a Qualificação
e o Ensino Profissional (ANQEP)
- João Carlos Costa – ATEC – Academia de Formação
- João Queiroz – Direção-Geral do Ensino Superior (DGES)
- José Manuel Castro – Faculdade de Psicologia e de Ciências
da Educação da Universidade do Porto
- José Gonçalves – Confederação Nacional das Associações de
Pais (CONFAP)
- Maria José Roseira – CTT
- Maria Emília Brederode Santos – Inquietações Pedagógicas e
Conselho Nacional de Educação
- Manuela Carlos – Grupo de Educação ETIC
- Teodoro Roque – Direção Geral dos Estabelecimentos
Escolares (DGSTE)
- Rui Pedro Brandão – Sistemas Digitais na Universidade EDP –
Energias de Portugal
- Sara Sousa Brito – Global Estratégias
- Felix Soares – Câmara Municipal de Lisboa
- Susana Teixeira – Academia de Formação Primavera
- Nuno Queiroz de Andrade – Associação Profissional de
Formadores (APF)
Reunidos
no dia 30 de março, os 14 participantes do workshop
1, dedicado ao tema do “Aprender - Sistemas de educação e formação” no
contexto da Indústria 4.0”, começaram, em resposta a um repto do coordenador
dos trabalhos, Etelberto Lopes da Costa, por referir a pertinência do tema nas
tarefas diárias de cada instituição ali representada e por elencar alguns
projetos em curso que se inscrevem na problematização ou tentativa de dar
resposta aos principais desafios que resultam da emergência de uma nova era,
pautada pela aceleração digital e pela industrialização robotizada.
Ana Cláudia Valente, em representação
da Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional (ANQEP),
referiu a enorme responsabilidade que recai sobre esta Agência no que concerne
à regulação das ofertas educativas e formativas de dupla certificação perante a
incerteza do futuro. Para o efeito, destacou a criação de um Sistema de
Antecipação de Necessidades de Qualificação (SANQ), através do qual a ANQEP tem
procurado antecipar as competências necessárias aos empregos de médio e curto
prazo. Outra dimensão por si referenciada como crucial prendeu-se com a
orientação, na perspetiva de poderem ser proporcionadas aprendizagens ao longo
de toda a vida.
João Carlos Costa, entendendo como
“irreversível” a importância da componente tecnológica, destacou o trabalho que
tem de ser feito ao nível das soft skills,
em particular porque “a aprendizagem ao longo da vida não vai ser uma opção mas
sim uma obrigatoriedade” que advém também dos desafios que já se perspetivam ao
nível da demografia (e que obriga a trabalhar por mais tempo) e do desemprego
(com a exigência de qualificações muito mais complexas). Outro domínio que
merece atenção é, no seu entender, o esbatimento que vai haver entre o que
entendemos hoje por profissões de homens ou de mulheres, o que obrigará a
repensar nas profissões. Ao nível da formação, importa ainda planear e
clarificar, com um objetivo comum que todos os operadores de educação e
formação deverão ter: colaborar para qualificar, em vez de concorrerem entre
si.
João Queiroz, afirmando-se “fã do
processo de Bolonha e da modernização do espaço de ensino superior”, recordou
que o que importa é que nos preocupemos com o que os alunos aprendem e não com
o que os professores ensinam. No processo de aprendizagem, é forçoso
estabelecer uma correlação entre competências e empregos do futuro, o que
pressupõe que tomemos consciência da necessidade de não formatarmos para o
exercício uma determinada profissão apenas.
José Manuel Castro trouxe ao debate uma
outra noção associada às profissões, já que “mais do que múltiplas profissões
ao longo da vida, iremos ter, no futuro, muitas profissões em simultâneo”. Como
tal, o importante não é tanto o que se aprende, mas antes o “como se aprende”,
sendo necessário distinguir entre “o que é premente e o que é permanente”. Ao
nível da premência, recordou ainda a existência de quase 80 milhões de adultos
(cerca de 1/3 da força de trabalho) com problemas de literacia na Europa.
A
visão dos pais, trazida ao debate por José
Gonçalves, centrou-se na necessidade de se perspetivar o futuro num
contexto de flexibilização curricular, que permita ajustar os currículos às
efetivas necessidades de competências sentidas pelas escolas, e ainda de pensar
na aprendizagem ao longo da vida não só para os filhos mas também para os
docentes.
Para Maria José Roseira, “a verdadeira
revolução vem com o conhecimento, com a comunicação e com a liderança”, pelo
que devemos ter noção de que há hoje novos modos de aprender (sentidos já nas
gerações mais novas) – aprendem no concreto e em ação. Importa ainda considerar
que temos de envolver diferentes gerações nos processos de aprendizagem e que o
modo como nos comportamos perante a aprendizagem será também ele alterado. A
título de exemplo, relembrou que a Internet trouxe-nos já uma alteração no
processo de memorização.
Em
defesa da educação como um direito e como uma forma de enriquecimento, Maria Emília Brederode Santos
demonstrou particular preocupação com os efeitos que podem advir nas ligações
(ou falta delas) entre educação e trabalho. “Pensou-se que o desenvolvimento
tecnológico libertaria o Homem do trabalho. Mas o que se passa é quase o
oposto”. Além disso, referiu, avizinha-se um perigo: “poucas pessoas com muito
trabalho e muitas sem qualquer trabalho”. Tudo isto justifica, tal como
referiu, não só um plano de ação mas também uma reflexão filosófica e ética.
Manuela Carlos, tendo por base o
trabalho desenvolvido na ETIC, destacou a importância de nos debruçarmos sobre
a questão “Como se aprende?”, partilhando da opinião que esta questão deve ser
colocada o mais cedo possível, acompanhando o aprendente desde tenra idade. Na
sua opinião, o currículo não necessitará de ser mudado. A mudança deve ser,
sobretudo, na forma como se aprende, havendo espaço para uma grande
diversidade. A título de exemplo, demonstrou como a dança pode servir para
ensinar geometria ou o teatro para o ensino da língua portuguesa. Outras
aprendizagens que considerou essenciais foram as que se prendem com a
criatividade, o trabalho em equipa, o pensamento crítico e o despertar dos
sentidos.
Considerando
a missão da DGESTE, Teodoro Roque
recordou a necessidade de se começar a aprender cada vez mais cedo
(justificando o investimento que tem vindo a ser feito na universalização das
respostas de educação logo aos 3 anos de idade), de se conceder autonomia às
escolas (garantindo a versatilidade nos modos como o processo de
ensino-aprendizagem pode acontecer) e sempre em ligação com o diálogo familiar
e com outras estruturas de atuação territorial, como as Comunidades
Intermunicipais.
Rui Pedro Brandão desmistificou a
preocupação que parece existir com a incapacidade de as escolas prepararem para
os empregos do futuro, já que, na sua opinião, isso nunca aconteceu: “as
escolas nunca prepararam para os empregos que existem”. Compete sobretudo às
empresas desenvolver o perfil dos colaboradores que querem ter se pretendem
vingar no mercado e ter sucesso. Nas empresas, esclareceu, “começamos pelo
competir. Para competirmos, precisamos de trabalhar e para trabalhar precisamos
de aprender”. Em todo o processo, o conhecimento é precisamente o único fator
de produção que não se compra, embora tenha um custo. A aprendizagem (interna
às empresas) é que determina a sua aquisição.
Situando-se
também numa perspetiva empresarial, Sara
Sousa Brito elencou os reflexos reais que se sentem hoje nas empresas e que
tendem a ser determinantes para o futuro: o modelo de liderança (mais esbatido
e menos autoritário), as novas competências, a virtual colaboration, bem como as novas metodologias (muito usadas
na seleção de talentos – ex: através da gamification).
Felix Soares, em representação da
Câmara Municipal de Lisboa, demonstrou preocupação com a potenciação das soft skills e referiu um projeto na área
da programação que a Câmara tem desenvolvido com crianças, logo desde o 1º
ciclo. Este projeto permitiu perceber que apesar de as crianças dominarem muito
bem a utilização de dispositivos como o telemóvel e o tablet, não lidam bem com os computadores. Estas crianças sabem
funcionar basicamente com apps, mas
estes conhecimentos não chegam para o trabalho que existirá no futuro.
Tendo
transitado muito recentemente da área do marketing para a educação, Susana Teixeira questionou o que podem
ser metodologias de apoio à transição para o digital, não esquecendo a
possibilidade do e-learning. Outra
questão com que se tem deparado prende-se com a forma de motivar os millennials no contexto atual.
Contrariamente a outras gerações, estes valorizam muito a formação, mas
demonstram exigências para as quais as estruturas não parecem estar ainda
preparadas.
Nuno Queiroz de Andrade focou-se na
credibilização da atividade do formador, na evidenciação da sua experiência
(preocupações que estão na base de duas recentes iniciativas da APF) e na
motivação para a aprendizagem. No seu entender o que motiva é “o prazer da
descoberta e o que essa descoberta pode proporcionar”.
Terminada
esta primeira etapa, os trabalhos do workshop
prosseguiram com um convite aberto para que, em diálogo, todos contribuíssem
com respostas às seguintes questões: “O que está a mudar nos sistemas de
educação e formação perante as exigências da Indústria 4.0 e o que nos vai
exigir essa transição” e “Na perspetiva da aprendizagem ao longo da vida, que
propostas/recomendações faz face a essas exigências?”
A
primeira a usar da palavra voltou a ser Ana
Cláudia Valente, salientando a preocupação que, em termos de políticas
públicas, deverá existir na criação de uma geração que, “sendo nativa no
digital, seja também competente nesse mesmo digital”. Uma questão que, na sua
opinião, prende-se com a necessidade de atrair mais jovens do sexo feminino
para as áreas da programação, da robótica e das engenharias, bem como com a
capacidade de antecipar o que possam ser as competências valorizadas, no
futuro, pelo mercado de trabalho. Neste último domínio, a dirigente da ANQEP
entende que terá de haver “inteligência no sistema que permita ir até um
horizonte mais lato, com cenarizações”, já que os empresários tendem a
posicionar-se num horizonte sempre muito curto.
A par
da necessidade de antecipação das profissões do futuro, há que intervir também
ao nível da orientação para essas mesmas profissões, o que, de acordo com José Gonçalves, passará muito pelo
papel dos pais, considerando que são “quem condiciona o futuro dos filhos”. O
responsável da CONFAP questiona mesmo sobre a possibilidade de passar a haver
“uma Futurália para os pais”. Afinal, é sabido que se existir nos pais a
preocupação de aprenderem continuadamente, os filhos segui-los-ão.
Outro
aspeto que poderia solucionar o aumento das qualificações e a procura de
qualificações mais ajustadas ao que é necessário no contexto da indústria 4.0
passaria por ter mais alunos no ensino superior. Portugal, recordou o dirigente
da DGES, “não tem ensino superior a mais, tem é alunos a menos”. No seu
entender, esta equação poderia ser diferente se se alterasse o modo do acesso
ao ensino superior por parte dos alunos provenientes dos cursos profissionais.
Recentemente, a DGES elaborou um estudo que permitiu concluir, tal como
informou João Queiroz, que dos cerca
de 46/47 mil jovens que entram no ensino superior todos os anos, 40.000 são
provenientes de cursos científico-humanísticos. De fora ficam cerca de 30.000
estudantes de cursos profissionais que não conseguem entrar neste nível de
ensino.
A
atratividade da formação, no entender de João
Carlos Costa, passará também pela capacidade de sabermos “usar as
tecnologias para customizar”, procurando ter, cada vez mais, percursos à medida
de cada formando. Neste contexto, o formador será essencialmente um tutor dos
percursos formativos.
Importa
ainda deslocar o foco dos percursos para os resultados das aprendizagens, sem
esquecer que não precisamos todos de ser engenheiros ou doutores. Esta é uma
pressão social, que enviesa tudo o que se possa fazer em termos de orientação,
à qual temos de resistir.
Um
melhor encaminhamento dos jovens para as soluções de qualificação existentes
passará também pela capacidade de fornecermos mais e melhor informação aos
jovens, tal como frisou Teodoro Roque,
o que implica maior envolvimento dos profissionais de orientação e dos
docentes. Neste domínio, há porém um fator que importa não descurar, relacionado
com o progressivo envelhecimento da classe docente.
Para Manuela Carlos, a incerteza do futuro
deveria levar-nos a “pensar a escola de outra forma”, lançando um repto:
“Porque não preparar só para a empregabilidade e para que os jovens possam ser
empreendedores?”. Importante seria ainda que as escolas não abandonassem os
jovens assim que estes completam o 12.º ano de escolaridade.
Maria José Roseira sugere que haja
também uma mudança a nível curricular, pois os currículos “ainda são muito
escolásticos”. Terão de integrar “pontes de transição” entre o ensino e as
empresas. A par da formação inicial, incita à criação de novas soluções na
formação contínua, sugerindo “uma atomização da formação” e mais “formação on job”. Outra solução passará pelo
recurso aos processos de reconhecimento, validação e certificação das
competências proporcionadas em contexto empresarial. A formação assegurada
pelas empresas tem, no seu entender, uma mais-valia para as mesmas: permite um
alinhamento dos colaboradores com os objetivos da empresa e o reforço da
liderança.
A
intervenção de Maria Emília Brederode
Santos permitiu sistematizar o que podemos ver hoje como tendências: uma
escolaridade mais longa para todos (começamos mais cedo e terminamos mais
tarde), a ocupar mais tempo (estende-se durante todo o dia, com mais horas para
os jovens, através das atividades complementares) e ao longo de toda a vida.
Assim sendo, a aprendizagem “tem de mudar para que não seja uma maçada”. Outra
tendência prende-se, na sua opinião, com o regresso, e em força, do termo
“competência”, o que liga com os saberes mobilizáveis, os saberes-fazer. Em
resposta, os currículos têm de ser mais ricos, vastos e abertos, até para
poderem responder à teoria das inteligências múltiplas, e as aprendizagens pressupõem
métodos ativos e uma organização da escola por projetos. Reconhecendo que nada
disto é novo (existindo muitos exemplos de sucesso em Portugal – como o da
Escola da Ponte, o da Escola Moderna ou da Educação pela Arte), na verdade,
essas inovações não vingaram. A viragem pressupõe, pois, no seu entender,
decisões políticas mas, acima de tudo, “que haja um compromisso a mais anos”.
Porque
o que queremos nas empresas é também o que queremos nas escolas, Sara Sousa Brito complementou a
intervenção anterior com a necessidade de, ao trabalharmos por projetos,
procurarmos “recriar a realidade das empresas nas escolas”, com criatividade.
Nesta
articulação, é conveniente termos presente que apesar de os jovens serem
considerados “nativos digitais” apresentam, como se comprovou nos projetos
desenvolvidos pela CML e ali partilhados por Felix Soares, grande dificuldade em tarefas como a filtragem da
informação disponível na internet. Os jovens necessitam de aprender a auto
aprender, uma competência de grande relevância já nos nossos dias.
Nuno Queiroz de Andrade acrescentou ao
debate a importância de se valorizar a profissão de formador, recordando-se que
se exige que estes profissionais sejam mais dinâmicos e flexíveis mas sem
qualquer tipo de compensação, verificando-se, inclusive, um decréscimo salarial
nos últimos anos.
O
valor da formação e o retorno que se pode obter com a mesma, desta vez na
perspetiva da empresa, foi a temática que encerrou o debate, com a intervenção
de Rui Pedro Brandão. Em Portugal,
referiu este especialista,” temos já muitos serviços Hi-Tech mas as empresas ainda são muito pouco Hi-Tech”. Para evoluírem necessitam de mais qualificação mas apenas
apostarão na formação se percecionarem algum retorno, sendo esta uma temática
que não poderá ser esquecida na resposta aos desafios que a Indústria 4.0
apresenta.
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